CEBs e Negritude: dois lados de uma mesma moeda!
Em Memória de Heitor Frisotti
+28/08/1998
“Senhor venho ofertar coisa
de negro, coisa de negro, coisa de negro afinal, coisa de negro!. Senhor, viemos fazer
memória do Heitor, que dez anos habita
Contigo e entregou uma vida dedicada a uma das causas mais proféticas nesta
América e nesta cidade de São Salvador da Bahia... o povo negro.
Todos que o conheceram e
tiveram a alegria em conviver com Heitor, querem nesta celebração e
memória, recordar os dez anos da sua
partida. No jeito próprio das CEBs faremos memória da sua vida e do seu testemunho.
Em nome das CEBs do Brasil,
recordamos os momentos que vivemos juntos na sua total dedicação às comunidades
o “jeito
normal de ser Igreja” no dizer de Pedro Casáldaliga.
Heitor Frisotti, Missionário
Comboniano, sendo italiano, fez do Brasil sua terra, da negritude
sua causa e mergulhou tão profundo na
nossa cultura e na nossa linguagem, capaz de saber o que
significa para nós a palavra “saudade”...
Por isso cantamos assim:
“Não
se admire se um dia, um beija flor invadir
A porta da tua casa, te der um beijo e partir
Foi eu que mandei o beijo que é pra matar meu desejo
Faz tempo que eu não te vejo, ai que saudade d'ocê!
A porta da tua casa, te der um beijo e partir
Foi eu que mandei o beijo que é pra matar meu desejo
Faz tempo que eu não te vejo, ai que saudade d'ocê!
Ai que “saudade” do Heitor
como pessoa: amigo, atencioso, simples, inteligente e irmão!
Ai que “saudade” – da sua presença
no Grupo Atabaque, juntando-se a tantas
outras pessoas faziam teologia a partir da negritude!
Ai que “saudade” – do
Heitor, no Centro de Evangelização de Periferia, lá na Penha... sua presença
questionadora nos ajudava a rever nossa prática e o lugar da Igreja no meio dos
pobres...
Ai que “saudade” da sua
presença nos Intereclesiais assessorando os blocos da causa negra, escrevendo
texto, mostrando que as Igrejas devem estar abertas ao diálogo inter-religioso...
Ai que “saudade” da sua
produção teológica publicada em tantas revistas, livros, filmagens, ainda hoje tão utilizada por todos nós...
Rogamos em “nome
de Deus de todos os nomes – Javé, Obatalá, Olorum, Oió”, que continuemos a trilhar os caminhos
do diálogo inter-religioso, a aprender sempre a lição que Heitor nos ensinou: “
beber do poço alheio” e ter os ouvidos atentos ao som dos atabaques e
da beleza negra!
Como CEBs continuamos a ser
o pequeno rebanho... nunca esqueço das nossas conversas... guardamos como uma
“relíquia” o primeiro esboço que ele fez, ainda em São Luis do Maranhão,
quando a Bahia foi indicada para sediar o 10º Intereclesial. Guardamos no
coração seu “sim”, para assessorar o Secretariado das CEBs. Sua presença era
esperada por todos nós. Todos os meses aguardávamos sua presença em Ilhéus para
passar aquela semana conosco. Ali “bebíamos” das suas sábias observações, seus
textos, sua preocupação de fazer a página na Internet do 10º intereclesial,
aproveitando o espaço que sua comunidade religiosa dispunha.
Heitor, as CEBs caminham...
As vezes com passos lentos e cansados... Somos desafiados pelo mundo urbano,
pela economia neoliberal, pelas facilidades dos que acreditam na teologia da
prosperidade... Mas as CEBs estão vivas... sobretudo enquanto houver cristãos
sensíveis aos sinais dos tempos, presbíteros e religiosas com o coração de
pastor e pastora, jovens e crianças com o olhar de esperança! Continuamos a
acreditar nesta mesma Igreja que você dedicou sua vida: as CEBs! No nosso
continente as CEBs seguem a sua missão profética, ecumênica e libertadora.
Desde o Intereclesial de
Ilhéus, que você ajudou a construir, as CEBs seguiram para Ipatinga (MG) e
agora “do ventre da Terra, o grito vem da Amazônia gritando por ecologia e
missão. Seguimos para o 12º encontro que acontecerá em Porto Velho em julho de 2009.
Convidado por teus irmãos/as
e amigos/as, gostaria muito de estar presente nesta “festa”, gostaria de ouvir
os atabaques baterem em tua homenagem, mas nesta data estarei em Porto Velho,
pra dizer que acreditamos nas CEBs e que dos nossos campos e das nossas cidades
nos chegam o clamor por justiça, partilha e paz. Por isso fica por escrito, o
que iria contar neste encontro da “Igreja da Caminhada”, daqueles que tiveram a
alegria em conhecer-te.
Permitam-nos publicar também
a carta que fizemos naquele 28 de agosto de 1998, quando recebemos a notícia do
teu falecimento.
Heitor... ai que saudade
d'ocê!
Pe
Edegard Silva Júnior,MS
Ilhéus-Ba 28 de agosto de
1998
“...Infelizmente,
séculos de preconceito, racismo e exclusão
nos impedem de
enxergar o sofrimento dos discriminados,
a fé do outro e a força de Deus, que está
presente nos terreiros...”
(Palavras do Pe. Heitor Frisotti)
Missionário Comboniano
* 05/04/1953
+ 28/08/1998
Nós
do Secretariado de CEBs para o 10º Intereclesial queremos manifestar nosso
profundo sentimento pelo falecimento do Pe. Heitor Frisotti, Missionário
Comboniano que trabalhava em Salvador - Bahia, e Assessor Regional das CEBs e
do Secretariado.
BRANCO DE ALMA
NEGRA!
Heitor
Frisotti tinha 45 anos de idade, italiano de nascimento, brasileiro de coração,
deixou sua terra natal e veio trabalhar aqui no Brasil. Em Salvador (BA),
dedicou-se aos trabalhos com a causa negra. Morava numa simples casa do Bairro
de Pau da Lima, onde os combonianos têm uma missão e lá junto com outras
pessoas criaram o Centro de Estudos e Pesquisa da Biblioteca Afro-Brasileira.
Vinha pesquisando e contribuindo na causa do diálogo inter-religioso.
Autor
de vários livros, membro do grupo Atabaque, participava da equipe de redação da
revista Sem Fronteiras, Heitor assessorava as CEBs também a nível nacional: em Santa Maria, no RS,
foi um dos assessores do bloco Afro; no processo de preparação do 9º
Intereclesial em São Luís
(MA), elaborou o texto sobre a questão Afro e assessorou o bloco Mãe Dudu.
Sempre colocando seus dons a serviço, também na área de informática, Heitor
colaborava, preparando as páginas para Internet.
Acompanhava
há anos as CEBs do Regional Nordeste 3 - Bahia e Sergipe, de forma que D. Mauro
Montagnoli, Bispo de Ilhéus (BA), o convidou para ser o assessor regional do
10º. A congregação dos combonianos o liberou para este serviço. Uma vez por
mês, Heitor passava uma semana conosco no Secretariado. Estes encontros já
estavam agendados até o mês de dezembro.
Começou
a sentir dores e febre constantes. Medicado foi diagnosticado que era hepatite.
A enfermidade se agravou transformando-se em câncer. Foi para
Verona, na Itália (centro de sua congregação) para fazer o tratamento, mas no
dia 28 de Agosto de 1998, partiu para Casa do Pai.
OS ATABAQUES
ESTÃO DE LUTO!
Heitor
nos ajudou muito a compreender e respeitar as diferenças culturais. Vestia-se
sempre de branco e nos ensinou os valores da cultura afro-brasileira. Assim
como os atabaques deixam de ser batidos na morte de uma pessoa do terreiro,
ficaremos em luto e sentindo muito a sua falta. Aos combonianos e familiares do
Pe. Heitor, nossa solidariedade.
Aqui
nos Secretariado, você deixou muitas marcas de sua passagem. Valeu,
Companheiro!
Saudades
de toda equipe do Secretariado de CEBs para o 10º Intereclesial.”
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